O palhaço que virou padeiro

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Imagem de Susann Mielke - Pixabay
Imagem de Susann Mielke - Pixabay

Que eu sou uma fiel adepta da boloterapia todo mundo já sabe. Pra mim, é um santo remédio. Vivo criando e fazendo bolos. É bolo disso, bolo daquilo. Recomendo muito. Dizem que fazer pão é como fazer bolo. Ambos são processos terapêuticos. Ainda não me aventurei. Quem sabe um dia desses coloco a mão na massa e passo a produzir fornadas e mais fornadas?

Mamãe fazia rosca da rainha. Uma delícia. As roscas eram grandes. Fazia caracóis também. Os meus preferidos. Mamãe abria a massa, cortava em retângulos e depois pincelada os pedaços com manteiga. Ai enrolava e pintava os caracóis com uma mistura de gema e água. Era pra dar brilho.

Roscas moldadas, forno quente, aí era só esperar o tempo da massa crescer. E lá vinha mágica. Mamãe enrolava uma bolinha da massa e colocava em um copo com água. Quando a bolinha subia, aí, sim, era a hora das roscas irem pro forno. Que delícia! Cozinha perfumada, mesa posta, café coado, roscas morninhas sobre a mesa. Uma celebração.

Não sei se comentei aqui, mas o Papai já fez pães, roscas e afins. Eu até nasci na casa que a nossa família dividia com a Padaria Rezende. Já faz muito tempo. Saudosista, Papai vive sonhando com um forno grande pra fazer pão pra nós. Alguém disse pra ele comprar em Pará de Minas. Produto bom, preço ótimo. Ele anda animado. Acho que vem pão por aí. Vai que com o forno novo e a companhia do Papai eu também animo a por a mão na massa, né mesmo?

Se não fosse a história dele com a panificação eu até poderia achar que o Papai foi mais um que aderiu à modinha da “pãodemia”. Uai, você não sabe o que é isso, não? Tão dizendo que na pandemia fazer pão virou mania. Que tá todo mundo no “modo” padeiro artesanal. Tem pão pra todo gosto. De abobrinha, batata, cenoura, castanha …. Mas o Papai quer mesmo é manter a tradição. O negócio dele é fazer pão francês. Aquele mesmo, o pão nosso de cada dia. Você ainda tem duvida que é saudosismo?

Falando em pão lembrei de um dos circos mambembes que certa vez aportou aqui em Conceição do Pará. Naquele tempo eu vivia aquela fase estranha, migrando de menina pra adolescente. O circo era muito pobrezinho. O público minguava a cada espetáculo. A renda da bilheteria mal dava pra comer.

Pensa daqui, pensa dali, a “troupe” decidiu fazer e vender pão pra juntar um dinheirinho. Mamãe, comovida, ajudava como podia. Doava farinha de trigo e comprava parte da produção. Papai apoiava orientando sobre o ofício. No fim, a aparência das fornadas não era das melhores. Os pães eram pequenos, duros e assados fora do ponto. Ora ficavam mal assados, ora queimavam. Não havia meio termo. A gente, um bando de crianças que devorava até pedra, comia mesmo assim. Afinal, era pra ajudar.

Isso foi há muito tempo. Mas, ainda hoje, tenho uma relação difícil com o circo. Pra mim, todo palhaço é triste. Não há quem me convença do contrário. Mas aí já é uma outra história. Conto depois.

5 COMMENTS

  1. Que lindo texto!! Gisele Bicalho com suas histórias maravilhosas e com emoção a flor da pele. A escrita nos faz sentir na pele a emoção. Parabéns!!

  2. Também, vejo o palhaço com um ser triste. Ninguém imagina que por trás da maquiagem ele pode estar perdido em suas melancolias. talvez tentando alegrar os outros ele possa compensar suas tristezas. Posso estar errada. Quem vai saber né?

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