André Carreira, o mineiro que leva milhões aos cinemas

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André Carreira, produtor de filmes de sucesso no Brasil

Num ano em que a produção cinematográfica brasileira cresceu, mas a bilheteria despencou, o produtor mineiro André Carreira cravou um feito na chegada de 2018. “Fala Sério, Mãe”, filme da sua empresa Camisa Listrada, levou 2,9 milhões de pessoas ao cinema com apenas um mês de lançado.

A comédia é estrelada por Ingrid Guimarães e Larissa Manoela, com direção de Pedro Vasconcelos e é o terceiro longa produzido por André que bate a marca de 1 milhão de espectadores.

Mais ponderado que entusiasmado, André Carreira é certamente mineiro quando justifica suas experiências de sucesso: “Quanto mais trabalho, mais sorte eu tenho, como dizem por aí”, brinca o produtor que entrou para o mercado audiovisual em 97, em Belo Horizonte, e resolveu desbravar a cena carioca nos anos 2000, sem nunca abandonar os vínculos com a terrinha.

“Fala Sério, Mãe” é uma façanha que lhe dá orgulho, mas também responsabilidade e outros desafios, no estilo pé no chão. Este ano, ele oficializou a Camisa Listrada BH, que terá autonomia para tocar projetos audiovisuais em Minas.

Paralelamente, a produtora carioca tem uma série de produtos na manga. Ainda este ano, estréia a cinebiografia de Mussum e, às vésperas das eleições presidenciais, lança “O Candidato Honesto 2”, com Leandro Hassum, na tentativa de repetir a façanha do primeiro filme, que levou 2,8 milhões aos cinemas brasileiros em 2014.

“No cinema brasileiro, o comediante é o super-herói. É onde conseguimos brigar com as grandes produções de fora. É com Ingrid Guimarães, Fábio Porchat, Leandro Hassum. Precisamos desenvolver outros gêneros tão competitivos como a comédia. Mas se ela é competitiva, por que não fazer?”

Carreira conversou com o Boas Novas e falou sobre sua trajetória e os filmes que produziu.

O produtor André Carreira
Para o produtor André Carreira, o Rio é a “Hollywood tupiniquim” | Foto: Camisa Listrada/Divulgação

Boas Novas — O público dos filmes nacionais diminuiu 42,8% de 2016 para 2017, depois de três anos de crescimento. Como você explica o sucesso de “Fala Sério, Mãe”, com 2,9 milhões em apenas um mês em cartaz?
André Carranca — É mais um filme, parte da nossa trajetória. A Camisa Listrada tem 20 anos de mercado e dedicação ao cinema e audiovisual. Como dizem por aí, quanto mais eu trabalho, mais sorte eu tenho.

BN — Como foi o começo no mercado de cinema?
AC — Não tinha faculdade de cinema, fiz publicidade e propaganda em Belo Horizonte. Comecei a trabalhar na produtora do Helvécio Ratton em 1997. Tive a chance de fazer com ele o filme “Amor e Cia”, com Patrícia Pillar, Marco Nanini e Alexandre Borges. Praticamente, não havia profissionais do cinema em Minas, a equipe vinha quase toda de fora. Fiquei cinco meses morando entre São João Del Rei e Tiradentes, onde o filme foi gravado. Quando voltei para casa, minha mãe falou ‘que bom você voltou’. Eu disse (risos): só vim pegar minhas coisas porque vou pro Rio, me chamaram pra outro projeto. E começou assim.

BN — E no Rio, antes da Camisa Listrada, como quem você trabalhou?
AC — Já cheguei com um projeto na TV Zero, do Roberto Berliner. Fiz filmes da Xuxa, Renato Aragão, Daniel Filho etc. Fiquei dois, três anos trabalhando direto, saindo de um projeto e entrando em outro. Sempre em ligação com BH, nunca perdi isso. Mesmo estando no Rio, voltava pra BH. Num desses momentos abri uma produtora chamada NaTora, com a qual ganhamos muitos prêmios fazendo trabalhos na capital mineira. Mas era como uma banda de rock e acabou.

BN — E a Camisa Listrada, como surgiu?
AC — Armando Mendz e Rodolfo Buaiz fundaram a produtora em 2001 e eu entrei de sócio. Eu queria fazer coisas pelo cenário mineiro, como se fosse uma missão produzir em Minas. Nessa época, Helvécio Ratton fez “Uma Onda No Ar” e fui diretor de produção, fiquei seis meses em Belo Horizonte. A Camisa Listrada começou a investir em várias frentes, publicidade, vídeos institucionais, curtas, documentários até conseguir fazer longas. Conseguimos fazer “O Menino no Espelho” (2014), filme que circulou muito em festivais, foi vendido para TVs, a HBO comprou para 18 países, foi distribuído pela Downtown. Mas, depois disso, ficou difícil conseguir recursos com as empresas mineiras para filmar…

Cena de “Fala Sério, Mãe”, filme do produtor André Carreira que ultrapassou os 2 milhões de espectaores

BN — Então o Rio voltou a ser atraente…
AC — Por outro lado, os mercados do Rio e São Paulo viviam a efervescência de Copa do Mundo e Olimpíada. Pensei, ainda estou novo, vale a pena ampliar os horizontes da produtora, entrar de novo no mercado do Rio. Acabei decidindo por abrir uma filial da produtora no Rio e me mudei definitivamente em 2013. Agora, tenho a Camisa Listrada BH, focada na produção de conteúdo em Belo Horizonte.

BN — “O Candidato Honesto” foi uma virada para a produtora, quando vocês passaram a fazer bilheterias grandes.
AC — Marca uma virada no perfil da produtora. A partir daí, intensifiquei a parceria com o diretor Roberto Santucci, com quem tenho diversos projetos já realizados e outros por vir, como “Farofeiros” e a cinebiografia do Mussum. A Downtown também se mostrou grande parceira na distribuição dos nossos filmes. Na nossa carteira, o que tem visibilidade são esses filmes comerciais, estamos rodando agora o “Candidato Honesto 2”, com previsão de lançar em agosto. Também estamos rodando o filme do Fábio Porchat, “O Palestrante”.

BN — A Camisa Listrada parece estar na contramão total. Fazendo sucesso, gerando bilheteria, com muitos projetos chegando… é o oposto do movimento brasileiro nos últimos dez anos.
AC — Estamos na contramão, mas é isso. Tudo que estou colhendo agora é resultado de 20 anos de trabalho muito sério e dedicado. Tem um fator importante, a crise não chegou ao audiovisual, essa é uma das áreas preservadas na economia brasileira. Temos um sistema de financiamento próprio, graças ao fundo setorial do audiovisual, em que o mercado gera seu financiamento, um modelo muito interessante, diferente das leis de incentivo. O Estado é sócio, todo o dinheiro que ele investiu no “Fala Sério” vai retornar, por exemplo. Conseguimos uma certa blindagem da crise com este sistema.

BN — Mesmo assim, como produzir o terceiro longa acima de 1 milhão de espectadores em um ano em que o cinema nacional não foi muito bem?
AC — Conseguimos direcionar esforços para produções com apelo comercial. Isso não significa que vamos abandonar outros tipos de produção, documentários mais autorais. Estamos filmando no sul do país uma produção sobre o legado italiano no Brasil, em coprodução com a Globonews, também estamos fazendo uma série sobre Inhotim, finalizando um documentário sobre Burle Marx e outro sobre a história das companhias de teatro no Brasil.

Leandro Hassum em cena de “O Candidato Honesto”, produção da Camisa Listrada

BN — Filmes com perfis bem diferentes…
AC — Sim. Eu acho que para disputar o mercado cinematográfico é preciso ter musculatura. Hoje, o que mais vemos são filmes-evento, com milhares de cópias, altíssimo investimento em mídia, como um espetáculo, efeitos especiais. Para tirar uma pessoa de casa, onde ela tem uma TV 4k e pode ver uma variedade de filmes pagando pouco, precisa ter alguma experiência. O que vemos é o encolhimento do mercado de arte e dos independentes migrando para TV e serviços on demand e os circuitos comerciais mais focados nos blockbusters. No cinema brasileiro, o comediante é o super-herói. É onde conseguimos brigar com as grandes produções de fora. É com Ingrid Guimarães, Fábio Porchat, Leandro Hassum. Precisamos desenvolver outros gêneros tão competitivos como a comédia. Mas, se ela é competitiva, por que não fazer e fazer bem feito? O exibidor precisa da sala cheia para bancar os custos, não adianta colocar goela abaixo filmes que não dão público.

BN — Um mineiro no Rio. O que o aproxima do Rio, o que atrapalha, o que ajuda, como vê a cidade hoje?
AC — A ligação do Rio com a cultura mineira é histórica. Os grandes expoentes da música e literatura mineiros vieram para o Rio. Eu sinto os mineiros muito bem recebidos aqui, acho que mineiro passa uma confiança, uma seriedade e pique de trabalho. E tem essa coisa eterna nossa de buscar o mar. O Rio vira esse portal, uma abertura para realização. É nossa Hollywood tupiniquim. Mas estou sempre voltando para BH. Pra comer um pão de queijo, ir num jogo do Galo, ver a família.

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