O pedreiro das florestas

Há dias o “velho” Osvaldo vem insistindo pra que a gente vá ao sítio fotografar um joão-de-barro. Na verdade, dois. O casal anda empenhadíssimo na construção da sua nova casa. Sinal que a família vai crescer e que vem filhote (ou seriam filhotes?) por aí. Papai, encantado, acompanha a labuta dos passarinhos, mezzo pedreiros, mezzo arquitetos.

Incansável, o casal de Furnarius rufus (seu nome científico) leva de três a cinco dias para construir a casa. Para dar conta da obra o casal chega a fazer de 500 a duas mil viagens. Haja esforço. Usam o bico pra carregar barro úmido e esterco misturado à palha. Galhos de árvores, postes, beiradas de casas e até mesmo orelhões são os locais preferidos dos passarinhos para edificar a nova moradia. Por aqui, a opção foi a árvore de pau doce.

Você não vai acreditar, mas apesar dessa trabalheira toda, o casal vai usar a nova casa apenas para uma única ninhada. Logo depois a moradia tão duramente construída será abandonada.

Mas não fique triste. Aí vem mais uma lição da natureza: todo esse esforço valerá a pena. Depois que for abandonada pelo casal a casa não ficará ociosa por muito tempo. Logo será ocupada por outras aves.

Pesquisando sobre o Furnarius rufus vi no Google que a arquitetura da casa do joão-de-barro é refinada. O formato é esférico, com abertura circular e duas câmaras para manter os filhotes protegidos de intempéries e predadores. A propósito, hoje o Papai comentou comigo que não vê o casal há dois dias.

• Será que desistiram e foram embora?
• Que nada! Estão dentro da casinha construindo as paredes dos quartos. Só depois disso vão terminar a parte externa e finalizar a obra, comenta o Papai com a certeza de quem aprendeu tudo só observando a natureza. Empirismo na veia.

Ah, sobre a área externa da moradia há um detalhe importante: a porta da casa é edificada na direção contrária ao vento. Embora os cientistas ainda não consigam explicar exatamente como o João de Barro desenvolveu tamanha habilidade é sempre assim. E tem mais: quando o casal muda para outra região constrói o ninho virado para o lado oposto. Que coisa, né?

“O fato é que esse pássaro aprende, ao longo da vida, a identificar a direção do vento. E quando vai construir o ninho, no período de reprodução, preocupa-se em deixar a abertura voltada para o outro lado”, afirma a bióloga Fernanda Junqueira Vaz. Achei lá no Google.

Ah, o joão-de-barro procria apenas uma vez por ano, geralmente na primavera. Certamente é para que o “joãozinho-de-barro” seja recebido em uma casa florida e perfumada. Esse casal pensa em tudo. Há muito para a gente aprender com eles. Aliás, com a natureza.

Antes de encerrar essa prosa toda sobre as habilidades do joão-de-barro, uma dúvida: afinal de contas, o macho é ciumento mesmo? Que história é essa que se ele for traído tranca a fêmea dentro da morada pro resto da vida? Pelo que ouvi, essa fofoca foi espalhada pelo cantor Sérgio Reis.

“(…) toda manhã, o pedreiro da floresta
Cantava fazendo festa, pra aquela quem tanto amava
Mas quando ele ia buscar o raminho
Para construir seu ninho o seu amor lhe enganava
Cego de dor, trancou a porta da morada
Deixando lá a sua amada presa pro resto da vida”.

Já cantou essa canção? Quem nunca, né?

E lá vou de volta ao Google. Pesquisa daqui pesquisa dali, conclui que não há qualquer tese científica que confirme a má fama atribuída ao joão-de-barro. Segundo os ornitológos, o que ocorre é o seguinte: as abelhas costumam se instalar nas casas do joão-de-barro. Para improvisar o ambiente de uma colmeia fecham a entrada.

E aí Sérgio Reis? A bola está com você. Que tal uma moda de viola pra limpar a barra do nosso “pedreiro da floresta”?