Curso de alfabetização de adultos da UFSJ abre novos horizontes para idosos

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Pâmela Thais, aluna do curso de Pedagogia da UFSJ, dá aula para adultos que só agora tiveram oportunidade de aprender a ler e a escrever. Foto - Divulgação
Pâmela Thais, aluna do curso de Pedagogia da UFSJ, dá aula para adultos que só agora tiveram oportunidade de aprender a ler e a escrever. Foto - Divulgação

São João del Rei – “Mãe, fui pra faculdade, mas volto pro almoço”. O bilhete em cima da mesa foi o portal mágico, como naquele programa do Sílvio Santos na década de 80. Pra quem não conheceu, a pessoa tinha um sonho e o portal se abria ao vivo. A fanfarronice do apresentador permitia realizar ou não o desejo de quem se aventurasse a querer e pedir.

Dona Maria se aventurou a ler depois dos 60 anos. Como ela, outras 8000 pessoas são analfabetas em São João Del Rei, de acordo com o Censo de 2010.  Naquele dia, dona Maria juntou as letras pela primeira vez e um mundo de esperança se abriu.

Não foi fácil. Maria das Graças Silva, 62, ajudou a mãe a criar os oito irmãos mais novos na roça, ficou viúva duas vezes, criou suas duas filhas, circunstâncias que não permitiram que ela estudasse. Aos 60, com o incentivo da filha que entrou na faculdade, decidiu procurar o curso gratuito de alfabetização de idosos oferecido pelo programa de extensão da Universidade Federal de São João Del Rei (UFSJ).

“A chegada é dolorosa; dizer ´sou analfabeto´ é uma condição que dá vergonha”, diz a professora Mônica de Ávila Todaro, coordenadora do curso.

Método Paulo Freire

Ter de trabalhar bem cedo para ajudar no sustento da família, ajudar a criar os irmãos ou morar em localidades distantes das escolas são circunstâncias que contribuem para elevar o índice de analfabetismo na camada mais pobre da população. Em 2012, dados do IBGE revelaram que mais de 10 milhões de brasileiros com mais de 60 anos não sabiam ler ou escrever; a maioria mulheres, negros e moradores da zona rural.

Mônica adota a metodologia do patrono da educação brasileira, o educador e filósofo Paulo Freire. Em 40 encontros de cerca de 1 hora, tal como a experiência pedagógica de Freire na cidade de Angicos (RN), é possível começar a alfabetização de um adulto.

O grupo é importantíssimo. A partir dele se constrói o texto a ser trabalhado nas aulas. Não existe uma cartilha padrão, mas a experiência vivida é a matéria prima de todo o processo. Quem sabe menos das letras contribui oralmente. A educação deve ser uma experiência transformadora.

O método nunca será individual, então é preciso cativar cada participante a continuar na jornada. O professor é chamado animador cultural. Tudo precisa fazer sentido. Não vale “Ivo viu a uva”. Alunos voluntários da universidade e um bolsista são preparados por Mônica para mediar os encontros, duas vezes por semana, na Sala Paulo Freire da UFSJ. Eles fazem um levantamento das palavras mais usadas e importantes para o grupo e, a partir delas, montam os textos-base para a alfabetização.

Trabalho de formiguinha

Ser professora alfabetizadora de pessoas idosas, com o pressuposto do letramento, segundo Todaro, é ir além do ensinar a decodificar signos. É conhecer cada estudante, aproximar os saberes escolares das experiências que cada um traz para a sala de aula e, desse modo, compartilhar ideias, tarefas, objetivos e significados.

“É um trabalho de formiguinha. Vivemos com as pequenas felicidades. O Brasil caindo aos pedaços e ficamos emocionados, um dia, quando alguém descobre uma letra”, diz a professor Mônica.

Mesmo os que se alfabetizam acabam permanecendo no grupo, um lugar de fala, encontro, saudade, de existência plena nessa etapa da vida.

Todaro avalia que Paulo Freire é super atual , mas ainda mal interpretado. “Ou repetem frases no jeito facebook de ser ou são contra sem nunca terem lido”. Para a professora, falta profundidade a um pensamento tão vivo e importante como de Freire.

Dona Maria fica feliz com os encontros durante a semana. Ocupa o tempo, encontra os amigos de mesma idade e se livrou da angústia que sentia por ter de pedir alguém pra ler as coisas pra ela.

“Quando eu cheguei em casa e li o bilhete da minha filha dizendo que tava na faculdade mas voltava pro almoço, esse dia foi minha maior riqueza. Ver o mundo com meus próprios olhos”.

O curso existe há dez anos e é realizado às segundas, quartas e sextas, de 17h30 às 19h, numa sala da universidade. Atualmente, oito idosos estão sendo alfabetizados, mas há mais oito vagas disponíveis.

MAIS: Há vagas para o Grupo de Alfabetização da UFSJ. Mais informações no telefone (32) 99810-1513

Para saber mais sobre Paulo Freire – http://www.paulofreire.org/o-instituto-paulo-freire

 

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