Enrique Vila-Matas: a reinvenção de uma literatura

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O espanhol Enrique Vila-Matas

Poucos autores em atividade escrevem tão bem e têm uma mente inventiva como Enrique Vila-Matas. O catalão tem certo parentesco com o melhor de Jorge Luis Borges, como uma literatura que transita entre a ficção e o ensaio, que embaralha as realidades e elimina fronteiras.

“História Abreviada de Literatura Portátil” (Cosac Naify), seu livro de 1985, capta o escritor num momento precioso, antes dos sucessos que o elevariam aos melhores da literatura espanhola. O livro é uma pequena joia, pequeno no formato, preciso como a tal da literatura portátil deve ser.

Vila-Matas homenageia criadores e suas obras. Cria uma sociedade secreta formada por 27 criadores (escritores e artistas), os shandys — referência a “Tristam Shandy”, de Laurence Sterne. Assim o narrador descreve os membros da sociedade:

“Como se exigir um grau de loucura não fosse o bastante, foram fixados dois outros requisitos indispensáveis para pertencer a essa sociedade: além de que a obra de cada um não fosse pesada e coubesse facilmente numa maleta, a outra condição obrigatória era a de funcionar como uma máquina celibatária, solteira.
Ainda que não fossem indispensáveis, recomendava-se também possuir certos traços considerados tipicamente shandys: espírito inovador, extrema sexualidade, ausência de grandes propósitos, nomadismo incansável, tensa convivência com a figura do duplo, simpatia pela negritude, cultivo da arte da insolência.”

Surgem na narrativa nomes como Duchamp, Man Ray, Fitzgerald, Aleister Crowley (considerado o traidor da sociedade), Céline, entre outros, recriados por Vila-Matas. A invenção cruza o caminho da realidade, mistura-se aos fatos. A escrita criativa do espanhol entrega uma leitura deliciosa.

O livro, de dimensões pequenas, como objeto, já é uma obra digna da sociedade secreta, portátil, fácil de carregar. Suas 140 páginas carregam uma literatura mágica, de rara invenção, que dá um sopro redivido ao que Borges criou.

Trecho

“Cometer o suicídio no próprio espaço da escrita. O que nasceu como um comentário irônico acabou se transformando em um princípio aceito por todos os membros da sociedade secreta. E ficou bem claro que, daí em diante, o suicídio só poderia ser cometido no papel. Antonio Artaud, por exemplo, respondeu assim a uma pesquisa surrealista em que os interrogados deviam dizer o que achavam da ideia de tirar a própria vida: “Mas o que você diria de um suicídio anterior, um suicídio que nos fizesse regressar, mas para o outro lado da existência, e não para o lado da morte? Só isso teria valor para mim. Não tenho apetite pela morte, eu sinto o apetite do não ser, de nunca ter caído nesse reduto de imbecilidades, de abdicações, de renúncias e de encontros obtusos”.

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O livro pode ser encontrado na Amazon ou na Estante Virtual.

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