Varre, varre vassourinha!

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Imagem - Pixabay
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Você tem algum mês do coração? Eu tenho. Mais de um. Gosto de maio. Mês da Mães, mês de Maria, meu mês. Tem também o meu aniversário. É no dia de Santa Rita. Não que eu seja festeira, que ame “parabéns pra você”. Longe disso. Não me sinto confortável com as sequelas que vêm com a virada de serra. Gosto especialmente de dezembro. Tempo de Natal, de reencontros com a família, das reuniões com os amigos.

Essa prosa toda é pra falar que vendo a Denise num esforço inútil para varrer o quintal daqui de casa, que nessa época fica coberto pelas flores da mangueira, me lembrei de um texto emocionante do Cláudio Chinaski. Nele, o escritor descreve o porquê de sua ligação com agosto.

“Minha mãe não gostava do mês de agosto (…) Todos os dias, logo cedo, ela varria o quintal de terra até expor as raízes das árvores. Não gostava das folhas caídas dançando alegremente nas ventanias de agosto.

Eu dizia: mãe, deixa as folhas aí. Mas ela não deixava. E eu dizia: mãe, você reclama do vento, mas age como o vento, arrancando a terra de cima das raízes. E ela não me dava conversa e todo dia varria, e todo dia descobria um pouco mais as raízes, e todo dia era essa luta inglória contra uma natureza que não se incomoda em repetir, dia após dia, o seu sempre eterno ser natureza.

Minha mãe não gostava do mês de agosto porque era seu aniversário (em algum universo quântico paralelo ainda é seu aniversário). Ela não gostava que os anos se acumulassem sobre suas costas, como não gostava das folhas se acumulando no chão do quintal. Varrer era seu jeito de tirar o tempo de sobre si. Como no caso das folhas, também era uma luta feita para ser perdida (…”).  Será que esse é o caso da minha irmã no seu varre, varre vassourinha!?

O mesmo texto me remete aos tempos da delicadeza, de quando a gente, um bando de filhos e filhas incontroláveis, tremia de medo do Saci Pererê. Em agosto, a qualquer momento o danadinho poderia saltar do redemoinho.

“(…) criança, tentava olhar o rodopio de cabeça inclinada por entre minhas pernas, que era o jeito de se ver o Saci, que se movia no giro rápido do redemoinho – um vento que arranca as pipas (papagaio, pandorga, quadrado, arraia, pipoca, pipeta, cafisa, que língua rica essa nossa) das mãos das crianças e as joga no distante do cerrado.

Por falar nisso, por onde andam os redemoinhos? Hoje, são tão raros como os vagalumes. Culpa das mudanças climáticas, creio eu.

Assim como o Chinaski, gosto especialmente do “ de um nascer de sol alaranjado e de um pôr de sol rubro como o sangue. Gosto de agosto porque a seca acaba com a gente e começamos a sonhar chuva, pedir chuva, desejar chuva, se emprenhar de chuva até estarmos repletos de chuva e nos ser permitido chover. Mas isso só no final de setembro ou começo de outubro.

Enfim, gosto de agosto porque o vento balança as árvores do instante em que o dia nasce até a hora em que é rendido pela noite, então parece que tem um mar sobre nossa cabeça, um mar feito de azul celeste e som de vento”. Pelo menos, balançava. Hoje, como eu reparei, com menos frequência e intensidade.

Quanto ao quintal da nossa casa, Denise o varre duas vezes ao dia. De maio a junho, são as folhas descartadas pela velha mangueira; em agosto tem chuva de flores derrubadas pelo vento; em novembro, o descarte das manguinhas que sobrecarregam a arvore e, em dezembro e janeiro, caem as mangas que sobreviveram à safra e de maduras tombam soberanas.

Se a gente aprecia o ciclo da natureza? Muito. Mas, haja braço. Haja disposição.

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