Bastidores da corte real brasileira

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Palácio Imperial, depois Museu Nacional, Rio de Janeiro, onde viveu a família real portuguesa
Palácio Imperial, depois Museu Nacional, Rio de Janeiro, onde viveu a família real portuguesa

Muitas coisas me tiram do eixo. Umas, mais; outras, menos. Natural, né? A gente vive mesmo entre extremos. É o bem contra o mal, o bom x ruim, o doce x salgado… Duro é achar o equilíbrio. No meu caso, então? Quando não gosto, sai de baixo. Mas se gosto, amo desesperadamente. Sabe aquela história de “nem tanto ao mar, nem tanto à terra”. Pois, é! Não se aplica à minha pessoa.

Por falar em gostar, nesses tempos estranhos tenho adorado viajar ao passado. E nesse flash back mergulhei de cabeça na história do Brasil. E aí dá-lhe pesquisa na internet, montanha de livros sobre Período Joanino, Brasil Império, Primeira República ..

Gosto especialmente das mulheres que participaram da construção da nossa história. Aprendi muito sobre Dona Maria I. A mãe de Dom João VI de louca não tinha nada. Era depressiva e vivia oprimida pela rigidez da educação católica. Gosto especialmente da Princesa Leopoldina, peça chave na independência do Brasil.

Estou de olho também no “lado B”. Se é que posso chamar de “lado B” o romance da Marquesa de Santos com Dom Pedro I e da Condessa de Barral com Dom Pedro II . Não há como ignorar o amor! Ah, o amor. Sobre a Marquesa eu poderia discorrer aqui sobre o amor carnal. Quanto à Condessa, não há como ignorar. A sua cultura e conhecimento da economia e da geopolítica pesaram no relacionamento com Dom Pedro II. Tanto pesou que se prolongou por mais de trinta anos. Haja amor, né?

Mudando um pouco o foco, gosto também de pesquisar sobre o que compunha o prato dos brasileiros no Brasil Império.

J.A Dias, autor de “O país das bananas”, acena com ótimas dicas. Segundo o autor, naquele tempo os homens reinavam na cozinha. Isso porque era preciso força nos braços pra lidar com os caldeirões, tachos, potes, alguidares, almofarizes, cimeiros, tripés, trempes, fogões a lenha e com os pilões de madeira usados para descascar o arroz, triturar o café e fazer paçoca.

E o que a Família Real e a sua extensa comitiva comeram durante a travessia para o Brasil? E não venha me dizer que você nunca refletiu sobre isso? Afinal, eram três meses navegando. Nesse período era preciso alimentar as cerca de 15 mil pessoas alojadas em oito naus, três fragatas, dois burguês, uma escuna, uma charrua mercante, além dos quatro navios de guerra britânicos da escolta.

Só na nau Capitânea, que levava Dom João VI e a mãe, se amontoavam 1050 criaturas”, conta J.A. Dias Lopes. Durante 90 dias esse mar de gente comeu peixe seco ou na salmoura, carne de sol, paio, chouriço, presunto, toucinho, galinha e porco. Tudo temperado com alho, cebola, alecrim, pimenta, azeite, vinagre e sal. Cardápio limitado tendo em vista que o tempo da travessia da Europa ao Brasil era longo.

Dom João VI logo se adaptou aos trópicos. Viveu por aqui 13 anos, um mês e 19 dias. Durante esse tempo demonstrou ter um apetite avassalador. O pesquisador C. J. Dunlop, no livro “O Rio antigo”, conta que diariamente, no almoço, o rei de Portugal, Brasil e Algarve comia três frangos sem molho, acompanhados de fatias de pão torrado sem manteiga. Quatro ou cinco laranjas-baía completavam a refeição. No final da tarde repetia o cardápio. E “na merenda voltava a devorar três frangos e outras tantas laranjas-baía”.

Essa predileção de Dom João por frango chegou até a provocar desabastecimento desse tipo de ave no Rio de Janeiro. “Os comerciantes reclamavam que a Família Real arremata tudo para abastecer a cozinha dos Palácios. Além da Corte, era preciso alimentar os criados e soldados, ordens religiosas, orfanatos, asilos e hospitais. Não havia frango que desse conta de tanta demanda.

Outro historiador, Luiz Edmundo, autor de “A corte de Dom João VI no Rio de Janeiro”, conta que o arroz de chouriço também estava entre as preferências do soberano.

Comilanças a parte, é preciso lembrar, como reconheceu J. A. Dias Lopes, que Dom João VI não foi apenas o rei guloso que fugiu de Portugal para escapar da invasão francesa. “Ele foi o único que me enganou”, reconheceu Napoleão Bonaparte em suas memórias.

E dá-lhe bastidores do quarto e da cozinha da história do Brasil.

4 COMMENTS

  1. Ótima crônica! Gisele Tem a capacidade, nessa sua escrita simples, mas, ao mesmo tempo elaborada, de nos trazer conhecimento e alegria na leitura.

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