Banquete no milharal, cortesia da Dinha Donana

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A Fazenda da Boa Vista produzia de um tudo. De fora, só vinha o sal, o tecido para vestir a família, os livros e adereços comprados pelo Vô Tatá para agradar a Dinha Donana, pequena na estatura, mas de uma fortaleza sem par. Da mesma forma que seduzia pela beleza e delicadeza do porte, impunha-se pela força, liderança, tino comercial e astúcia.

Vô Tatá era só admiração por aquela pequena grande mulher. E da varanda, onde recebia quem o procurava em busca de cura, Vô Tatá coordenava aquela vastidão de terra, onde, além das plantações e do gado, tinha, acreditem, uma pequena usina hidroelétrica para geração de energia própria e uma usina de açúcar que consumia a produção de cana local.

Em época de colheita aquele lugar virava um furdunço. Era preciso contratar mais gente para ajudar a peãozinho local. E foi numa dessas ocasiões que o pasto virou salão de banquete. Naquele dia, a comida, como sempre de primeira, chegou quente e cheirosa, aguçando o apetite e o paladar de quem pegava no pesado. O almoço da peãozada vinha nas gamelas. O do Vô Tatá a Dinha Donana distribuía amorosamente em panelinhas que brilhavam ao sol de tão areadas que eram. Nas gamelas e nas panelinhas a mesma comida: arroz, feijão, carne, abóbora e farinha.

Assim que a bóia chegou começou a confusão:

Não sou porco prá comer essa lavagem, reclamou um dos homens contratados para ajudar na lida.

Onde já se viu comer comida de gamela, continuou a ladainha.

O sol ainda nem tinha se posto e a Dinha Donana já sabia do ocorrido. Só que ela nada disse, nada comentou.

No dia seguinte, hora do almoço, sol a pino, fome que só vendo. E num é que de repente, quem aparece no meio do pasto? Sim, a própria, a Dinha Donana. Com ela, vieram uma mesa e várias tralhas. Do embornal saíram porcelanas, baixelas, talheres de prata, cristais e toalha de linho. Calmamente, arrumou pratos, garfos, facas, taças, tigelas e, sem pestanejar, convidou o peão insatisfeito a sentar-se à mesa com ela. E ainda lhe puxou a cadeira.

– Sente-se, por favor, pediu, emendando:

Vosmecê é muito educado. Não lhe cai bem comer sem conforto, servindo-se em gamelas.

Quem sobreviveu à história conta que até hoje não se tem notícias do tal peão, que nem da comida provou. Saiu desembestado pelo pasto sem olhar para trás.

Papai sorri de orelha a orelha quando conta a história. É personagem da cena. Estava lá, acompanhando a avó na armação do banquete no milharal. E se depender da memória dele vem muito mais histórias por aí.

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