A casa que herdamos dos nossos pais foi construída há mais de cinquenta anos. Graças ao empenho e ao sacrifício deles, hoje dormimos sobre o ouro. Mas aí já é uma outra história. Conto depois. Ou seria melhor abafar o caso? Vai saber, né?
Voltando ao xis da questão, como em toda casa de mais de cinco décadas, volta e meia nos deparamos com problemas estruturais. A maioria, nas partes hidráulica e elétrica. É cada surpresa que nem te conto. O último surgiu há poucos dias: dois vazamentos, um na copa e o outro na sala de televisão. Tudo leva a crer que o problema tem a ver com o banheiro social, cuja reforma, pasmem, foi concluída recentemente. Uma verdadeira saga. Vocês não imaginam a trabalheira que deu. E para encontrar o mesmo azulejo da época da construção da casa? Uma caça ao tesouro que nos levou a peregrinar por vários “cemitérios” do dito cujo.
E para encontrar e reparar o vazamento sem perder todos os azulejos históricos a saída foi escavar um buraco do outro lado da parede. Só que, até agora, nada de achar a origem do problema. O trabalho é exaustivo. Feito na base da marreta. As paredes são sólidas. Foram construídas com os tijolos na horizontal. Papai queria que a casa sobrevivesse a todos nós. Que servisse como morada para várias gerações dos Bicalho Resende.
Voltando ao buraco, ele está ali, aberto, como que nos desafiando. Pra que lado seguir? Uma aventura às cegas que está nos exigindo muita calma. E haja suor e imaginação. A abertura na parede remete a histórias da família e a informações garimpadas nessa vastidão cibernética.
Vovó Cocota contava que bebia guaraná fresquinho sempre que visitava a Comadre Raimunda. Na época não havia geladeira. Para manter o refrigerante fresquinho havia uma cavidade na parede semelhante ao nosso buraco. A inspiração para o arranjo engenhoso talvez tenha vindo das construções europeias do século 17. Nelas há aberturas feitas para serem usadas como isolamento para as pessoas que naquela época conviviam com a peste bubônica. A maioria ainda pode ser vista em imóveis da Itália, principalmente na região de Florença.
Assim como aconteceu com a Covid, naquele tempo as pessoas precisaram se isolar por causa da doença, o que levou bares e tavernas a fecharem as portas. Como solução para continuarem servindo os fregueses, os italianos criaram as buchette del vino, literalmente, janelas minúsculas, mas com espaço suficiente para passar um braço e, o mais importante, uma taça. Essas janelas voltaram a ser usadas com o mesmo objetivo durante o período da Covid. Não é o caso do nosso buraco, mas que parece, isso parece.
Ah, e sobre dormir sobre o ouro, Papai contava que se confundiu ao carregar o caminhão com o material que seria usado na construção do alicerce da nossa casa. Ao invés de cascalho comum, carregou o caminhão com um cascalho ainda por minerar. Quando deram falta da preciosidade já não havia mais nada a ser feito. Com o alicerce pronto e as paredes erguidas, as pepitas que poderiam ter mudado o rumo da nossa história estavam definitivamente sepultadas. Herança que hoje só tem serventia para conversas em torno da mesa e para aguçar a curiosidade dos netos e bisnetos.
- Tia Gisele, é verdade mesmo que tem ouro debaixo da casa do Vovô?
- Tia Gyslaine, conta de novo a história do ouro do Vovô.
Essa conversa ainda vai render. Quanto ao fim do buraco da parede e da busca pela origem do vazamento, haja paciência. Só Jesus na causa. Ainda vem muita marretada por ai.
Como tem histórias divertidas essa família!!!Adoro!
Quanto ao buraco,haja paciência!😬
Familia grande sempre rende boas hustórias. Rsss. Beijo pro cê.