Em busca de inspiração para a escrita de hoje, revistei o trabalho de Anthony Bourdain. Obviamente que meu dia se tornou simplesmente improdutivo. Fiquei, como sempre, hipnotizada. Anthony era dessas pessoas que buscamos pela vida como companhia para uma cerveja no happy hour de sexta-feira. Valorizava a simplicidade da comida de rua, das chefs escondidas dentro de restaurantes e botecos despretensiosos.
Enquanto esteve em Belo Horizonte (minha Meca gastronômica), conheceu pequi, taioba, angu, canjiquinha e fumo de rolo. Entre suas frases ditas, a mais repetida foi: “Man, that is good”. Bourdain entendeu o sentido do boteco e o quanto ele se funde com a cultura gastronômica de toda cidade mineira. A cada cena do episódio, eu resgatava um pouco da minha ascendência. Marias, Iolandas, Iedas, Dárias, Terezas, Berenices começavam a pipocar na minha cabeça.
O frango caipiria com ora-pro-nobis “panhado” no quintal , o quiabo que não babava, o queijo curando em cima da geladeira, o frango ao molho pardo, o mingau de milho verde que introduziu na minha vida esse elemento que permeia minhas principais criações: o milho. Lembrei da receita de broa da Bisa e fui buscar no caderno da vovó.
Meu Deus! O doce de goiaba da vó, que eu sempre chamei carinhosamente de “goiaba de potinho”. Se você ainda não se permitiu comer esse doce preenchido com um creme mascarpone e chantilly, definitivamente você ainda não viveu o bastante.
A cozinha mineira é a base de tudo que eu faço, é a luz que clareia o horizonte das panelas. Mesmo quando a técnica é francesa ou a massa italiana, é de Minas que nasce o perfume. É nas montanhas que escondo minha alma, é da comida simples de Minas que nasce minha identidade na cozinha. É daqui, do alto dos mirantes de Belo Horizonte, que busco enxergar o mar, para criar os peixes, os camarões, as lulas…
A receita de hoje traduz meu desejo impossível de viver numa Minas Gerais com mar. Hoje fundi o robalo com a moranga e a castanha do baru (Dipteryx alata). Para quem não conhece baru, é uma árvore muito comum no Triângulo Mineiro e permeou vários trabalhos que fiz como bióloga.
Robalo com crosta de baru e musseline de moranga
Para o robalo
- 2 postas de robalo (somente o lombo, sem pele)
- 1 taça de vinho branco seco (não seja mão de vaca, use um pouco do Chardonnay que você comprou para servir com o jantar)
- ½ cebola
- 3 dentes de alho
- 2 colheres de sopa de salsinha
- 2 colheres de sopa de cebolinha
- 2 colheres de sopa de alho poró
- sal e pimenta do reino a gosto
Bata todos os ingredientes acima no liquidificador (MENOS O PEIXE, CLARO!) e reserve. Tempere o Robalo com sal e pimenta do reino moída na hora. Coloque o peixe imerso na marinada.
Assando o robado
- 1 folha de louro
- 2 dentes de alho com casca
- 8 rodelas de limão china, ou limão cravo (aquele alaranjado que tem no quintal da vó)
- 80g de castanha de baru triturada levemente no processador
- 2 colheres de sopa de parmesão
- 1 colher de sopa de farinha de rosca
- 2 colheres de sopa de azeite
Disponha o limão em duas fileiras, uma para cada posta de peixe. Misture a castanha de baru, o parmesão, o azeite e a farinha de rosca até que consiga perceber uma liga entre eles.
Pressione essa massinha contra a mão para moldar uma espécie de manta para o robalo e a posicione sobre ele. Essa será a casca crocante. Coloque o peixe sobre o limão. Adicione azeite, os alhos com casca e a folha de louro. Asse a 200°C por 15 ou 20 minutos.
Musseline de moranga
- 400g de moranga
- 1 colher de sopa de manteiga
- 100g de nata (ou creme de leite fresco)
- 1 colheres de sopa de gengibre
- 1 colher de sopa de raspa de limão
- 1 colher de sopa de açafrão
- alho com casa
- sálvia
- pimenta da Jamaica
Tempere a moranga com sálvia fresa, pimenta da Jamaica e sal. Asse até a moranga ficar bem mole. Despreze a casa e bata no processador a moranga, o gengibre e metade da nata.
Coloque a manteiga na panela, adicione o açafrão, o creme de moranga e por fim o gengibre. Mexa até ficar na consistência que lhe agrade.
Se quiser, vale grelhar abobrinhas e berinjelas no azeite para complementar o prato
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Para ler as crônicas e as receitas de Marina Cunha, acesse a página da coluna Cozinhas Gerais!