Sou avessa a críticos gastronômicos. Ainda construo na minha cabeça uma imagem muito parecida ao personagem Anton Ego, do divertidíssimo “Ratatouille”. A ideia de uma pessoa que nunca vivenciou a guerra diária de uma cozinha profissional julgar o resultado que esse local produz me causa um certo receio.
A experiência gastronômica tem relação com nosso passado. Cada prato pode despertar em uns as melhores lembranças e em outros funcionar como um banho de água fria. Talvez seja por isso que eu considere cozinhar uma arte. Ela depende da interpretação de quem a consome.
Recebi pelo Alertas Google uma entrevista com Luiz Américo, crítico de gastronomia que já escreveu alguns livros (“Eu Só Queria Jantar” e “Pão Nosso”) e está prestes a lançar outro sobre pães. Compartilho com ele a ideia de que a cozinha brasileira tenha um espírito “convival”.
Nossos pratos “brutos” servidos em caldeirões e com fartura (moquecas, feijoada, frango ao molho pardo, canjiquinha com costela de porco) são um deleite para famílias numerosas, sejam elas de parentes ou amigos.
Nossa relação com a comida precisa ser preservada de modismos e dessa nova onda de medicalização da comida. Demonizar o glúten, toda sobremesa de forma radical… Não consigo ver o que ganhamos com isso.
Reparem! Antes, tínhamos poucos produtos industrializados. Hoje, com a invasão da junkie food e de alimentos ultraprocessados no país, achamos mais “saudável” comer um pão fitness sem “caloria” (rs), sem açúcar, industrializado e sem gosto do que um pão caseiro feito com farinha, fermento e água. Não consigo entender como isso faz sentido para alguém.
Claro que é necessária uma visão mais crítica sobre nossos hábitos. Temos uma cultura de sobremesas extremamente adocicadas, nada que um pouco de treinamento e técnica não consiga resolver. Nossa cultura não pode ser destruída por um padrão tão distante dela.
Utilizar frutas de qualidade, ser criativo para substituir o leite condensado, usar o que temos de produto local, tudo isso pode nos ajudar a dosar o açúcar e inovar no processo de cozinhar. Esquecemos daqueles conselhos antigos de nossas avós sobre a composição de cores na elaboração dos pratos e refeições.
Muito dificilmente vou produzir, algum dia, obras de arte visuais como Jordi Roca. A cozinha me toca de uma maneira diferente. Gosto de servir pratos em que as pessoas se sirvam de um lugar comum e que a divisão seja condição única da refeição. A cozinha pra mim é um eterno compartilhar e isso é minha inspiração principal.
Pensando em formas de compartilhar e reduzir açúcar, e para aproveitar o gancho do Natal e a infinidade de frutas disponíveis, proponho um desafio: torta desconstruída de frutas.
Receita da torta de frutas
- 100 g de maça desidratada
- 100 g de ameixas secas
- 30 g de uvas passa (não é obrigatório)
- 3 pêssegos frescos
- 3 nectarinas
- 50 g de damascos
- 1 xícara de chá de blueberry
- 1 cálice de cointreau
- 1 copo de suco de laranja
- 2 colheres de sopa de açúcar refinado
- 2 colheres de sopa de mel
- 2 colheres de sopa de açúcar mascavo
- 3 paus de canela
- 2 pitadas de noz moscada
- 3 cravos
- suco de 2 limões
- folhas de hortelã
- massa folhada
- flores para decorar
Misture todas as frutas, o mel, o suco dos limões, o açúcar mascavo, canela, noz moscada e o cravo, coloque espalhado em uma travessa e leve ao forno a 180° C por, aproximadamente, 30 min.
Enquanto assa, prepare a calda. Coloque em uma panela o açúcar refinado e espere derreter. Adicione o suco da laranja e dissolva o açúcar todo. Depois, acrescente o licor espere ferver e junte as folhas de hortelã. Tampe e reserve.
Corte a massa folhada em retângulos de 7 x 4 cm, pincele com ovo e asse até dourar.
Para montar o prato, posicione a massa, as frutas e regue com a calda e finalize com as flores comestíveis. Caso queira adicionar chantilly ou sorvete, combina super bem.
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