O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) reconheceu oficialmente os Saberes do Rosário como Patrimônio Cultural do Brasil. O anúncio ocorreu durante reunião do Conselho Consultivo do órgão, realizada hoje (17), em Brasília, com a presença de representantes das festas populares em Belo Horizonte.
A decisão marca o fim de uma longa jornada: foram quase 20 anos de mobilização, estudos e articulação entre comunidades, pesquisadores e gestores públicos. Agora, manifestações como o Congado, as Congadas e o Reinado passam a integrar o Livro de Registro das Celebrações como bens imateriais da cultura brasileira.
O reconhecimento nacional reforça o papel dos saberes afro-brasileiros na construção da identidade do país. Em Minas Gerais, onde a tradição é mais forte, existem mais de mil grupos ativos, entre congadeiros, moçambiqueiros, catopês, marujos, candombes e diversas guardas.
Reconhecimento histórico e compromisso futuro
De acordo com o Iphan, o título tem caráter histórico e reparador. Mais do que um ato simbólico, ele representa um pacto entre o poder público e as comunidades tradicionais, voltado à preservação e valorização da fé e da cultura popular afro-brasileira.
Segundo o presidente do Iphan, Leandro Grass, a partir de agora o desafio é outro:
“Partimos para uma nova fase, que é a implementação de políticas com instrumentos de gestão, educação patrimonial e investimento público, para que toda a população reconheça a importância desses saberes”, afirmou.
A antropóloga Fernanda de Oliveira, responsável pelo dossiê técnico que embasou o registro, destacou que os Saberes do Rosário são mais do que uma celebração religiosa.
“É um sistema de pensamento e de construção de comunidade no Brasil. Esse reconhecimento valoriza a intelectualidade dos povos pretos e marca um novo momento na história do país”, explicou.
No ano anterior, os caminhos, expressões e celebrações ligadas ao Rosário já haviam sido reconhecidos como Patrimônio Imaterial de Minas Gerais. Agora, com o selo nacional, abre-se a possibilidade de novas políticas públicas e ações estruturantes para garantir a continuidade dessas tradições.
Saberes do Rosário: Tradição viva em mais de 330 municípios

A tradição do Rosário está presente em mais de 330 municípios de Minas Gerais, com raízes profundas nas comunidades negras e devocionais do estado. É por isso que o reconhecimento tem forte impacto local e regional.
Lideranças religiosas e culturais comemoraram a decisão com emoção. Isabel Casimira, Rainha Conga de Minas Gerais, sintetizou o sentimento coletivo:
“Nossa vida é uma história brasileira escrita com o sangue dos nossos antepassados. É a fé que canta, dança, reza, fala, ri e chora. E que trabalha, dia após dia, para que nosso povo não seja escondido nem esquecido”.
O reconhecimento dos Saberes do Rosário como patrimônio imaterial é mais do que um ato institucional: é o reconhecimento da resistência, da fé e da força cultural de um povo que ajudou a construir o Brasil.