Um amor que não se mede

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Imagem - Pixabay
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Uma rolagem sem compromisso pelo Instagram me levou direto para o tempo da delicadeza. Nada de novo para quem, generosamente, me lê por aqui. Não é segredo que volta e meia me transporto para essa zona de conforto. Também é de conhecimento público que essa viagem costuma acontecer quando o bicho pega. E como pega, viu?

O post em questão é sobre o livro “Esperando Bojangles”. Pelo que li em uma publicação feita pela editora Autêntica Contemporânea a obra conta a história de um menino que cresce em meio à fantasia criada pelos pais. É nesse lugar especial que a realidade dança no ritmo das emoções.
O romance transita entre a alegria e a melancolia. A narrativa acontece pelos olhos de uma criança que observa o amor intenso dos pais. A mãe é vibrante e imprevisível. Ao longo da obra pai e filho a acompanham em sua dança caótica pela vida enquanto lidam com os limites entre fantasia e realidade. Resumindo, porque ainda não li, e para não dar spoiller, pelo que entendi o livro não é só uma celebração do amor incondicional. Vai além. Tem ainda um olhar sensível sobre os desafios da saúde mental e os impactos emocionais que permeiam essa relação.

  • Mais e daí? Há casos de saúde mental na sua família? Sua mãe era caótica? Vocês e seu pai lidavam com o caos imposto pela sua mãe? Afinal de contas, o que essa obra escrita pelo francês Olivier Bourdeaut tem a ver com a rotina prosaica da uma família tipicamente mineira vivendo em uma cidade pequena plantada nos grotões das muitas Minas?

Se são perguntas que não querem calar, as respostas estão na ponta da língua:  o link entre a nossa realidade e o conteúdo do livro é a fantasia, que nada mais é do que uma estratégia amorosa criada pela mãe do menino para tornar a realidade mais palatável, algo que conheço como a palma da minha mão. A nossa infância, minha e dos meus irmãos e irmãs, foi bem assim. Vivemos numa bolha por anos. Nessa época, a fantasia pautava a rotina.
E foi essa fantasia que nos amparou até a pré-adolescência. Envolvidos numa poderosa teia protetora de afeto, desconhecíamos as mazelas do mundo real.  Afinal, o que poderia haver de errado se a mesa era farta, se tínhamos roupas no verão, abrigos no inverno (naquela época bem mais rigoroso) e peças novas para serem usadas em datas especiais? Se nos aniversários havia bolo, doces e presentes e se no Natal, a ceia, os enfeites e os presentes eram de lei?
O nosso ninho era confortável e amoroso. Nele não havia espaço para sacrifícios. Éramos felizes. Só mais tarde tivemos ciência. O esforço dos nossos pais nos privou do mundo real até que ele se impôs. Em algum momento a fantasia caiu por terra. Se foi traumático? A resposta é sim. Foi doloroso? No início, sim. Depois, como de costume, o amor em sua forma mais livre. E, mais uma vez, uniu e fortaleceu a nossa família. Provou a sua força, não como um laço que aperta, mas como um abraço que acolhe e une. Se antes o peso recaía inteiramente sobre os ombros daqueles dois, a partir daí passou a ser repartido entre nós. Não apenas nas tarefas do dia a dia, mas nas dores, nos desafios e, por que não, nas vitórias. Poucas, é verdade, mas grandiosas em sua celebração.
Talvez seja essa partilha o que ainda hoje nos mantém de pé, mesmo que convivendo com as ausências. O presente? São as memórias, vivas e pulsantes, sustentando cada passo da nossa caminhada.

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