Jazz é o que resiste — uma torta com alma

0
1458
Marina Cunha e sua torta jazz

Hoje, não vou falar de comida – não por enquanto. Já liguei a playlist e a alma tem petiscado em cada sopro de clarinete que já ressoou em Nova Orleans.

A cada nota adicionada nessa mistura, o petisco evolui e vai tomando corpo de prato principal. Saio de 1900 — Sidney Bechet — e despenco em 1930. O swing de Duke Ellington me traz uma vontade incontrolável de cozinhar e quando chego em 1940 ganho de presente o bebop. Bud Powell, Thelonious Monk e Charlie Parker invadem meu corpo e eu já não controlo mais nada. Os dedos parecem reproduzir notas imaginárias e somente um fouet para acalmar esses espasmos involuntários.

Plagiando Tim Maia, eu só queria chocolate! Puro, sem leite, com toda potência do cacau, em sua forma mais negra, mais complexa. É preciso coragem para assumir a força do chocolate. Para boa parte das pessoas, é mais fácil o chocolate ao leite, sabor leve, pouco expressivo, mas a mim interessa o chocolate mais intenso, 75 ou 85%, pelo menos.

Sabe aquele chocolate desbocado, com voz de Nina Simone e cara de Rosa Parks: coragem, potência e emoção incontrolável? Esse sabor que preenche as papilas gustativas assim como o jazz preenche a alma. Inteiro! Intenso!

Queria, então, uma receita com alma de jazz, que fosse sensual e ao mesmo tempo delicada. Algo que dançasse na boca. Quem sabe bolhas de ar explodindo e liberando um gosto de liberdade, de vida pulsando no palato. Logo me veio à cabeça uma mousse. Aerada, cremosa e tenra. Com a rusticidade de um chocolate amargo e a delicadeza que só claras em neve podem garantir em um preparo.

Essa mousse reinaria num palco de massa sablée e seria coroada com o fruto proibido, glaçado com muita manteiga, canela e noz moscada. Para finalizar, o crocante das castanhas brasileiras dariam a nota final no mastigar e a justa homenagem a Naná Vasconcelos.

Enquanto como, nada mais, só o jazz.

A torta jazz de Marina

Dica de filme: “Jazz”, por Ken Burns.

Um agradecimento ao querido amigo Giordano Pagotti que me proporcionou junto a tantos queridos de Uberlândia (Jack Will, Diego Caaobi, Gringo, Tim Fernandes, Edson Júnior, Cajuzinho, Luciana Zaramela e Tico) tantas terças de jazz no Estação Cultura e outras tantas noites do Alfaiataria. Minha gratidão eterna!

Não esqueçam de seguir o @cozinhasgerais no Instagram e acompanhar dropes de afeto e cozinha ao longo da semana!

Receita da Torta Jazz

Massa Sablé

  • 250g de farinha de trigo peneirada
  • 125g de açúcar refinado
  • 125g de manteiga sem sal
  • 1 ovo

Misture todos os ingredientes até ficar uma massa lisa e homogênea. Quando conseguir formar uma bolinha lisa, pare e deixe a massa descansar envolvida em um saco plástico por 30 min (esse tempo é muito importante).

Abra a massa em uma forma de fundo removível, faça furinhos em toda massa com um garfo e asse em 180°C até que a massa comece a dourar.

Mousse de chocolate

  • 170 g de creme de leite fresco gelado
  • 4 gemas
  • 50 ml de café espresso ou café bem forte em temperatura ambiente
  • 40 g de açúcar refinado
  • 2 g de sal
  • 5 ml de extrato de baunilha (ou o conteúdo de uma fava de baunilha)
  • 170g de chocolate (75%) derretido com um pouco de creme de leite fresco quente (cerca de 1 xícara de café, daquelas pequenas, hein!)
  • 2 claras

Em uma panela banho-maria, bata vigorosamente as gemas com metade do açúcar e o café usando um fouet até que faça ponto de fita (quando você levanta o fouet, faz um creme longo que conecta o fouet ao creme que fica na panela). Esse processo dura cerca de 1 ou 2 minutos e o termômetro precisa registrar 70°C.

Misture esse creme ao chocolate até derreter, misture suavemente para ficar uniforme. Deixe descansar e atingir a temperatura ambiente.

Bata as claras em neve e adicione o restante do açúcar aos poucos. Divida as claras em neve e adicione ao chocolate aos poucos. Misture de baixo para cima para incorporar.

Por fim, bata o creme de leite fresco até virar chantilly (cuidado para não exagerar ou vai virar manteiga) e adicione no restante do preparo de forma delicada, para não remover a estrutura aerada que as claras já conferiram ao preparo.

Maçãs glaçadas

Retire as cascas das maçãs, e fatie em meia luas finas. Derreta em uma frigideira a manteiga, o açúcar e acrescente a canela em pau a noz moscada e as maçãs. Deixe glaçar até dourar e espere esfriar.

Montagem da torta

  • 100g de castanhas (baru, castanha de caju, amêndoa, macadâmia, castanha do Pará e pistaches)

Coloque a mousse sobre a massa já assada e fria, nivele com as costas de uma colher. Distribua as maçãs do centro para for, sobre a mousse. Como se reproduzisse o desenho de uma concha, em caracol.

Finalize com as castanhas trituradas no processador e delicie-se!

*****

Confira as outras receitas de Marina Cunha na coluna Cozinhas Gerais!

LEAVE A REPLY

Please enter your comment!
Please enter your name here